Os Sistemas de Informação Geográfica (SIG) são uma ferramenta digital poderosa para promover uma compreensão mais aprofundada das interações entre o ambiente e a saúde, oferecendo uma vasta gama de oportunidades, tanto para a saúde urbana como para a saúde planetária. Contudo, este texto de divulgação é necessariamente breve e, como tal, apresento nele uma lista não exaustiva de oportunidades, filtrada pelos meus interesses e pela minha experiência enquanto geógrafa e investigadora na área da saúde pública.
Oportunidades em Saúde Urbana
Nas cidades, onde a densidade populacional e a complexidade de exposições ambientais são elevadas, os SIG permitem mapear, analisar e visualizar dados sobre os resultados e determinantes de saúde. Um exemplo claro é a capacidade de monitorizar a qualidade do ar, uma questão central nas cidades atuais. Através dos SIG, é possível identificar zonas mais afetadas pela poluição e cruzar esses dados com dados de saúde (por exemplo, provenientes de coortes geocodificadas, registos hospitalares, estatísticas vitais), avaliando assim o impacto desta na morbimortalidade, saúde e bem-estar.
Os SIG também oferecem oportunidades para estudar o impacto de exposições urbanas “terapêuticas”, como por exemplo os espaços de convívio e os espaços verdes (parques e jardins) e azuis (praias e zonas ribeirinhas). Estes ambientes têm sido reconhecidos como promotores de saúde e bem-estar mental, social e físico, e os SIG permitem determinar com precisão a acessibilidade geográfica aos mesmos. Esta informação pode ser usada para planear novos parques, caminhos pedonais ou infraestruturas de lazer, com base em evidência científica robusta que relacione a proximidade a estes espaços públicos urbanos e a saúde.
Outra área com grande potencial é o uso de SIG para identificar desigualdades na distribuição de recursos de saúde. Os SIG podem mostrar variações no acesso a serviços essenciais, como hospitais, centros de saúde e farmácias, permitindo que os gestores de saúde planeiem de forma mais eficiente a localização de novos serviços, conhecendo as necessidades reais da população. Além disso, os SIG permitem uma análise integrada de múltiplos fatores, como rendimento, transporte, estado de saúde das comunidades, condições de habitação, etc., que afetam as necessidades em saúde. Esta capacidade de visualizar padrões complexos e tomar decisões baseadas em dados concretos oferece uma grande vantagem para promover a saúde pública nas cidades.
Aliás, graças a estas capacidades, os SIG são ferramenta essencial no desenvolvimento dos Planos Municipais de Saúde (PMS). O PMS é um documento estratégico, desenhado de acordo com as especificidades e necessidades de cada município, com o objetivo de promover a saúde da população, apoiando-se em indicadores robustos e estratégias cientificamente fundamentadas. Os SIG têm aqui um papel crucial na identificação das necessidades de saúde da população e na definição dos territórios prioritários para intervenção.
Oportunidades em Saúde Planetária
No contexto planetário, os SIG oferecem oportunidades para lidar com os impactos das alterações climáticas e outros desafios ambientais na saúde humana, animal e ambiental. A sua capacidade para integrar dados de diferentes escalas e fontes permite monitorizar os efeitos das mudanças climáticas na saúde de forma precisa e em tempo real. Por exemplo, podem ser usados para identificar os territórios mais vulneráveis a desastres naturais, como inundações, secas ou incêndios florestais, ajudando as comunidades a prepararem-se e responderem a estes eventos. Simultaneamente, os SIG podem apoiar programas de mitigação, ao identificar zonas de risco que requerem intervenções urgentes, e programas de adaptação, ao apontar ações que possam proteger a saúde da população contra exposições ambientais prejudiciais.
Os SIG são igualmente fundamentais para a gestão de doenças que estão a aumentar com as alterações ambientais. Doenças transmitidas por vetores, como a malária e o dengue, são sensíveis às mudanças climáticas e às transformações nos padrões de uso do solo. Utilizando dados espaciais, é possível prever a propagação dessas doenças e planear estratégias de contenção de forma mais eficaz. Este tipo de informação permite uma resposta mais rápida e direcionada.
Uma outra oportunidade em saúde planetária reside na capacidade dos SIG de promover uma abordagem mais integrada e interdisciplinar. A saúde planetária, assim como outras abordagens integrativas como a “Uma Saúde”, reconhece que a saúde humana está intrinsecamente ligada aos ecossistemas e ao clima, assim como a circunstâncias geopolíticas e socioeconómicas. Com os SIG, é possível cruzar dados multitemáticos, oferecendo uma visão holística das ameaças à saúde global. Esta capacidade de integração facilita a cooperação entre diferentes áreas do saber e setores de atuação, promovendo soluções sustentáveis que beneficiam tanto o planeta como as populações.
Avanços tecnológicos
O avanço tecnológico nos SIG também gera oportunidades, como a utilização de dados de satélite para monitorização ambiental em larga escala. Além disso, a combinação de SIG com a inteligência artificial (IA) e Big Data promete transformar ainda mais a análise e previsão de problemas de saúde relacionados com o ambiente. Outra tendência promissora é o desenvolvimento de plataformas de SIG de acesso aberto, que permitem a colaboração entre diferentes setores e comunidades. Estas plataformas tornam os dados geoespaciais mais acessíveis a investigadores, profissionais de saúde e cidadãos, aumentando o envolvimento da sociedade na promoção da saúde pública.
Conclusão
Em suma, os SIG oferecem um grande leque de oportunidades para transformar a saúde urbana e planetária, desde a melhoria das condições de vida nas cidades até à proteção da saúde planetária face às mudanças ambientais globais.
Ana Isabel Ribeiro
Licenciada em Geografia
Mestre e Doutora em Saúde Publica
Investigadora Doutorada Integrada e Coordenadora do Laboratório de Saúde e Território do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto.